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.: Um menino da Chapadinha :. |
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|||No pequenino bairro da chapadinha da
Guareí
do dia 9 de dezembro de 1912 veio ao mundo Francisco
Vieira Trindade, filho do casal Sr. Antonio Vieira e
D. Lygia David de Ávila. Agricultores cujos
antepassados figuraram entre os fundadores do
município em 1880, o Sr. Antonio e D. Lygia tiveram
ainda vinte outros filhos, os quais, entre homens
fortes e mulheres resolutas, larga descendência
constituíram em Guareí e demais rincões do país. |
|||Naquelas primeiras décadas do século XX, poucos se
podia esperar que o jovem Francisco e seus irmãos
pudessem contemplar um futuro diferente que fosse
das lides com a fértil terra roxa da economia
agrícola de então. Nesse mister, pois, Francisco
cresceu e passou a adolescência, já plenamente
alfabetizado pelo grupo escolar da cidade e
pressuroso em entrar com o pé direito na vida
adulta, adquirir a sua propriedade, constituir sua
família e seguir adiante com os seus sonhos.
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|||O ano é 1930 e com dezessete anos completos Francisco
opta por tornar-se motorista. Seu gosto por veículos
motorizados desde menino e a possibilidade de
iniciar uma carreira de chofer o fazem deixar o
convívio da fazenda e a buscar oportunidades que o
levassem a concretizar a sua mais cara aspiração. |
|||Mas como encontrá-las? A Guareí de então poucas
chances oferecia para um jovem como ele sem
experiência profissional alguma no volante. |
|||O impasse que se viu envolvido encontraria uma solução
mais imediata se ele se alistasse (8º BCP) na
Força Pública do Estado de São Paulo, mais
especificamente no
8º Batalhão de Caçadores Paulistas
(8º BCP) que em 1931 estava sediado em Itapetininga,
SP. Lá poderia tornar-se soldado motorista. Era uma
possibilidade que ele sabia de outros terem
conseguido em outros batalhões da corporação e ele
haveria de conseguir também. |
|||E foi assim que aconteceu. Quis a divina providência
que Francisco se alistasse e se tornasse motorista
do batalhão, mas a sua plena capacitação nessa
função ocorreu na prestação de verdadeiros e
impressionantes serviços de guerra, durante o maior
movimento cívico do Estado de São Paulo, a saber, a
Revolução Constitucionalista de 1932. |
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.: Em busca de um sonho :. |
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|||O que Francisco não imaginava quando pensou em se
alistar naquele ano de 1932 era de que São Paulo
romperia com o Brasil exigindo a reparação de seus
direitos, o fim do Governo Provisório de
Getúlio Vargas
e uma nova Constituição. |
|||Quando irrompeu a revolução naquele inesquecível 9 de julho
de 1932, o prédio que servia de sede para o 8º BCP
tornou-se o Quartel General do Exército
Revolucionário do Setor Sul, sob o comando do bravo
coronel Brasílio Taborda. |
|||Agora como soldado da Força Pública, a única preocupação de
Francisco até então era a de ser uma praça distinta
pelo fiel cumprimento de seus deveres, o que
rapidamente conquistou para si a admiração de seus
pares e superiores, em especial do comandante de sua
companhia, o capitão Jardim. |
|||Incumbido de organizar os efetivos revolucionários de
Itapetininga, este capitão não se esqueceu do
soldado Francisco e muito menos de suas habilidades
enquanto competente motorista e tenaz estafeta.
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|||Com efeito, indagado pelo major Garrido, comandante do
3º Batalhão de Caçadores Voluntários (3º BCV) sobre
quem poderia ser o seu motorista particular, o
capitão Jardim não hesitou em indicar o soldado
Francisco para aquela árdua e espinhosa missão. |
|||Iniciava ali, sem que nenhum deles soubesse, a
trajetória de serviços prestados à causa da
Revolução Constitucionalista que inscreveria o nome
de Francisco no rol dos heróis daquela cruenta
campanha. |
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.: Na vanguarda das linhas inimigas :. |
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|||Como motorista do comandante do
3º BCV,
Francisco esteve presente em todos os combates que o referido batalhão
participou e não poucas foram as vezes que teve de
deixar o volante, tomar do fuzil e bater-se com o
inimigo nas trincheiras por São Paulo. |
|||O batalhão de Francisco combateu as forças
governistas durante três meses na região de
Angatuba, São Miguel Arcanjo e Capão Bonito, mas foi
na região do Rio das Almas que este batalhão e
demais unidades do Exército Revolucionário do Setor
Sul ali operantes consignaram os seus nomes nos
anais da História Militar pátria. |
|||O Combate do Cerrado, mas que para a posteridade
ficou registrado como o Combate do
Rio das Almas, foi um dos entreveros mais sangrentos de toda a
Revolução Constitucionalista. |
|||Localizado na região de
Capão Bonito, este rio é conhecido até os dias de
hoje pelas manifestações fantasmagóricas lá
existentes, resultantes do violento morticínio
ocorrido nas jornadas dos dias 17 e 18 de Setembro
de 1932. |
|||Retiro de fantasmas ou não,
o soldado paulista que lá combateu e morreu defendendo sua posição nas
trincheiras soube demonstrar toda a sua garra e
inexcedível galhardia, resistindo com granadas de
mão e por fim até a última baioneta calada contra o
avanço da infantaria do
general Valdomiro Castilho de Lima, que só
conseguiu tomar o reduto revolucionário após ataque
de pesada artilharia e bombardeio de aviação. |
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|||No seu livro "Vitória ou Derrota" (1936), o general de divisão
Dilermando Cândido de Assis, então capitão servindo
no Estado Maior do general Valdomiro, relata que
após o troar da artilharia e o bombardeio da
aviação, não restou outra alternativa senão tomar as
trincheiras à baioneta porquanto os filhos de São
Paulo estavam irredutíveis naquela posição. |
|||A parte escrita que recebeu de seu subordinado, o
1º tenente Clóvis Gonçalves, comandante de um dos
pelotões que atacou os paulistas nas barrancadas do
Rio das Almas, bem descreve os lances de heroísmo
demonstrados pelos soldados constitucionalistas,
descrição essa na qual ele chega até a louvar o
valoroso procedimento de seus oponentes: |
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"O inimigo não se rendeu. Os elementos escalados para
resistirem a todo transe, apoiando a retirada dos
demais, permaneceram no posto de sacrifício, ou
morrendo, ou sendo presos em plena luta. Honra
pois aos trinta e cinco prisioneiros do Rio das
Almas" (ASSIS, 1936, p. 386, grifos nossos). |
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|||Estes trinta e cinco prisioneiros mencionados na
parte do tenente Clóvis são os jovens paulistas do
lendário batalhão 14 de Julho que o Soldado
Francisco havia conhecido e combatido lado a lado,
porquanto fora ele um dos que, apoiado por esses
mesmos bravos que lá ficaram, conseguiu bater em
retirada quando da completa tomada das trincheiras
revolucionárias pelo fuzil, artilharia, aviação e
por fim baioneta. |
|||Hoje prestes a completar 100 anos de idade,
Francisco ainda vê desfilar em sua retina as ondas
da infantaria atacante, o ensurdecedor rasgar das
metralhadoras automáticas, o enlouquecedor troar dos
canhões e das explosões das bombas lançadas pela
aviação inimiga, o tinir do aço que encontra aço
para depois encontrar a carne. Gritos, urros,
imprecações, sangue, morte, ferimentos, desespero,
tantos acontecimentos passados que se entrechocam
num misto de memórias heróicas e dolorosas que seus
largos anos de vida não conseguem e talvez jamais
conseguirão apagar. |
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.: Um herói volta para casa :. |
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|||Com a queda das forças constitucionalistas no
combate do Cerrado, pouco restaria para as forças
governistas desfecharem as derradeiras manobras que
levariam a completa rendição de São Paulo a 2 de
outubro daquele ano.
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|||Francisco e seus companheiros remanescentes
retraem para Itapetininga, participando ainda de
outras encarniçadas ações na região do Paranapanema,
quando então naquele fatídico segundo dia do mês de
outubro é participado do fim da revolução pela qual
combateu com o melhor de suas energias, juventude,
idealismo, garra e determinação. |
|||Já ocupando a graduação de terceiro-sargento por
ocasião da rendição, Francisco não mais era aquele
imberbe soldado recruta que cruzara os portões do 8º
BCP um ano antes em busca de melhores oportunidades
de vida.
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|||No campo de combate, fosse a frente do volante da
viatura de seu comandante, fosse com o olhar fixo na
massa de mira de seu fuzil dentro das trincheiras,
Francisco soube honrar a esperança que São Paulo lhe
devotara e por méritos próprios, consubstanciados em
atos de bravura praticados em meio ao sibilar
mortífero da munição inimiga, fora promovido às
graduações de cabo e terceiro-sargento no curto
espaço de quase quatro meses da revolução que
participou de fio a pavio.
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|||O que lhe restou disso tudo? a vida, no florescer
dos seus 20 anos ainda por completar dali a dois
meses, repleta de novas oportunidades e sonhos que
mesmo o mais sangrento dos entreveros que participou
não conseguiu abafar em seu jovem coração. |
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.: Chico Trindade: 100 anos :. |
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|||Na sua farda de sargento do Exército
Constitucionalista do Setor Sul, Francisco retorna à
Guareí para junto aos seus pais e irmãos retomar a
vida de outrora.
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|||Os dias, as semanas, os meses passam e conhece ele
o amor na pessoa da jovem Ruth Brisac e com ela tem
quatro filhos, Wilson Vieira Trindade, Acácio Vieira
Trindade, Norma Sueli Vieira Trindade e Wilna Brisac
Trindade, os quais vieram para trazer-lhe alegrias e
profícua descendência. |
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Francisco Vieira Trindade e sua filho Wilson Vieira Trindade
Fonte: Acervo da família Trindade |
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|||Empregado como motorista
do
Departamento de Estradas de Rodagem, Francisco
nesse cargo aposenta-se após 35 anos de serviços
prestados e desse período até os dias atuais, ele
tem se dedicado aos familiares e àqueles que o
procuram para saber de fatos e feitos de nossos
Ex-Combatentes da revolução de 32. |
|||Juntamente com o Sr.
Osvaldo Raphael Santiago, Francisco Trindade é um
dos últimos Ex-Combatentes de 32 que combateram no Setor Sul durante a
Revolução Constitucionalista. |
|||Outrossim, a memória de quase um século de
existência, a robustez física e mental, bem como o
largo e humilde sorriso no rosto são de impressionar
qualquer pessoa que
um dedo de prosa troque com o "Seu Chico
Trindade". Confessamos que difícil é imaginar como
por tantas emoções pode ele passar e manter-se tão
lúcido e sereno no presente momento da vida.
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Xico Trindade - um paulista às ordens!
Fonte: Acervo da família Trindade |
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Essas foram as impressões que vivenciamos quando tivemos
a oportunidade e o privilégio de com ele estar para
a realização de entrevista que gerou o presente
texto.
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Em 19 de Junho de 2013, contudo, todos os que conheceram
o Sr.
Francisco Vieira Trindade, o Seu Chico
Trindade
enlutaram-se ao serem informados do seu falecimento,
aos 100 anos, ocorrido às 13 horas desse dia que
concluiu o último capítulo da vida desse insígne
paulista, dedicado brasileiro e último Ex-Combatente de
32 que pertenceu e combateu pelo Exército
Constitucionalista do Setor Sul. ARMAS EM
FUNERAL
para um ex-combatente itapetiningano da Revolução de
1932 que deixou um legado de amor, respeito e
patriotismo a todos os seus descendentes e àqueles
que privilegiados foram em com ele conviver. |
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Francisco Vieira Trindade
(1912 - 2013)
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|||Seu sepultamento se deu no Cemitério Municipal de
Itapetininga, tendo uma
nota de falecimento
sido emitida acerca de seu
lamentável passamento. |
|||Entrementes o seu passamento, gostaríamos, de agradecer
aos familiares do Sr.
Francisco Vieira Trindade, em especial ao seu
filho Wilson Vieira Trindade e seu neto Wesley
Vieira Trindade por terem amenizado toda sorte de
dificuldade para que o nosso encontro enquanto ele
estava em vida fosse coroado de êxito nos propósitos
para os quais se destinou, resultando neste texto. |
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Portal Paulistas de Itapetininga |
Sustentae o fogo que a Victória é nossa! |
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