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.: Caminhos do destino
:. |
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|||Quando em uma das entrevistas
realizadas com o Ex-Combatente
Francisco Vieira Trindade,
viemos a descobrir, por informações prestadas por
seu filho, o Sr. Wilson Vieira Trindade, que
além de seu pai e do Ex-Combatente
Osvaldo Raphael Santiago,
havia outro Ex-Combatente de 32 que ele próprio tinha
ouvido falar, mas que sabia ser falecido, mas cujo
primeiro nome ele se lembrava, qual fosse,
Durvalino. |
|||Por não saber de nenhum outro detalhe
a respeito de Durvalino, deu o Sr.
Wilson encerrado o assunto e mês e pouco se
passou desde o nosso último encontro, sem que nada
mais ouvisse eu dele sobre a pessoa desse
Ex-Combatente
desconhecido. |
|||Não obstante, quando da minha visita
ao Cemitério Municipal de Itapetininga para o
levantamento de maiores dados sobre o Ex-Combatente
Francisco Fabiano Alves
em fins de julho, vim a conhecer as pessoas
do Sr. Wilson Gomes de Almeida Júnior e o Sr.
Walter Luiz de Oliveira, sendo o primeiro
funcionário público lotado no cemitério e o segundo
advogado.
|
|||Ambos mostraram-se muito solícitos à
minha busca por informações e me ajudaram no que
puderam, sendo que o Sr. Walter
ofereceu-se para apresentar-me a pessoa de
Francisco Manoel Soares, o "Seu Chiquinho" como
ele o chamava, funcionário aposentado da Prefeitura
que tinha a particularidade de guardar tudo o que
lhe caísse em mãos: revistas, documentos antigos e
livros raros sobre a história da cidade.
|
|||""Se alguma coisa a mais sobre o
professor Fabiano
o senhor quiser encontrar, talvez o Seu Chiquinho
poderá ajudar com as coisas que ele tem lá na casa
dele" - foi o que me disse o Sr. Walter
enquanto nos dirigíamos até a casa de Chiquinho.
|
|||"E realmente estava
Walter certo, até além do que eu esperava. |
|||"Chiquinho nos recebeu em sua casa e
pressurosamente nos levou para conhecer a sua
biblioteca. Ali, de imediato, retirou ele uma cópia
do
número
4 da Revista Câmara Aberta, ano 2, edição de
janeiro de 1987, na qual consta uma foto que hoje
ilustra a página do
vet.
Francisco Fabiano Alves
e logo em seguida nos emprestou o livro
ITAPETININGA ONTEM-HOJE
(1986) do célebre escritor e historiador
itapetiningano
Carlos Fidêncio. |
||| |
|
Fonte:
Francisco Manoel Soares |
||| |
|||"Foi ao folhear esse
livro que as surpresas que me aguardaram emergiram
de forma incisiva.
|
|||"De fato, tais
páginas não só me revelaram um pouco mais sobre a
vida de uma das irmãs de Fabiano, a D.
Juliana Fabiano Alves (p. 170), como no Apêndice
II da obra, intitulado REVOLUÇÃO DE 32, vim a
encontrar texto biográfico sobre Durvalino de
Toledo, o mesmíssimo Ex-Combatente de 32 que o Sr.
Wilson Vieira Trindade havia me falado da
existência, mas que se lembrava apenas do primeiro
nome. |
|||"Que enorme e
satisfatória surpresa! |
|||"Com efeito, ao chegar em casa, li de uma tomada só o
capítulo "BLINDADO, O HERÓI ITAPETININGANO",
constante na página 371 da obra
ITAPETININGA ONTEM-HOJE de Carlos Fidêncio e, tomando por base as
informações ali existentes, que colhidas foram por
esse autor em depoimentos a ele prestados pelo
próprio Durvalino de Toledo, em meados de
1985, apresento a seguir o resgate da história desse
Ex-Combatente, cujos contornos e desenlaces de sua vida
realmente demonstram quão feliz e apropriada foi a
escolha do título "BLINDADO, O HERÓI
ITAPETININGANO" para o texto biográfico que lhe
fora escrito por Carlos Fidêncio. |
||| |
||| |
.: um goleiro da Força Pública :. |
||| |
|||Segundo o seu
biógrafo Carlos Fidêncio, o nosso
Ex-Combatente de
32, Durvalino de Toledo nasceu em
Itapetininga em 29 de janeiro de 1907, filho do Sr.
Eugenio de Toledo e da Sra. Brasilia Maria
do Espírito Santo, casal itapetiningano de
família humilde, honrada e trabalhadeira, cujos
membros gozavam de excelente saúde, otimismo,
iniciativa, garra e desprendimento, porquanto o
jovem
Durvalino, desde os mais ternos anos, já
demonstrava não só esses atributos, mas exibia no
largo sorriso, um enorme e generoso coração. |
|||Nesse ambiente
prenhe de valores sadios, Durvalino cresceu e
sua expressiva complexão atlética, altura e largas
espáduas denunciavam uma força física incomum, que
aliada a um profundo senso de responsabilidade, não
tardaram para fazer dele destaque não só na
profissão de pedreiro que abraçou, como também na
prática desportiva enquanto goleiro do time do
bairro. |
|||Sua desenvoltura
física não passou desapercebida dos colegas mais
chegados, que o apelidaram de "onça" e que mais
tarde não deixaram de recomendá-lo para integrar o
time de futebol do
8º Batalhão de Caçadores
Paulistas (8º BCP) da
Força Pública do Estado de São
Paulo (atual Polícia Militar do
estado). |
|||Com relação ao seu
ingresso naquele time, Carlos Fidêncio, nos
alerta na página 372 de seu livro que Durvalino
por dois anos fora goleiro desse batalhão sediado em
Itapetininga, até que, em fins de 1931, o comando do
mesmo deliberou que se ele quisesse permanecer no
time, teria que ingressar
na Força Pública. |
||| |
|
Detalhe do campo de esportes do 8º BCP em 1931 onde
praticava Durvalino |
Fonte: Livro
A FORÇA PÚBLICA DE SÃO PAULO (1931,
p.124) |
||| |
|||Seja como for, a
paixão pelo futebol realmente falou mais alto e
deixar a prática desportiva que tanto gostava seria
algo impensável para o Durvalino na plenitude
de seus vinte e quatro anos. Que sentasse praça,
então! trocava a profissão de pedreiro pela de
soldado da Força Pública, mas não deixaria o time do
coração que tantos gols já havia defendido e haveria
ainda de defender. |
|||Provavelmente foram
esses, sem dúvida, os pensamentos que povoaram a
mente de Durvalino e o motivaram a envergar a
mesma briosa farda cáqui de seus companheiros de
futebol. Não obstante, desconhecia o jovem
itapetiningano que dali a menos de um ano, a decisão
de assentar praça lhe acarretaria participar
ativamente do maior movimento cívico do Estado de
São Paulo, a
Revolução Constitucionalista
de 1932. |
||| |
||| |
.: da bola para o fuzil :. |
||| |
|||Conforme vimos nos
estudos realizados sobre as participações dos
Ex-Combatentes
Francisco Vieira Trindade
e
Osvaldo Raphael Santiago na revolução
de 32, quando esta irrompeu na memorável jornada de
9 de julho, o prédio da atual sede do DER de
Itapetininga tornou-se o
Quartel General do Exército Revolucionário do
Setor Sul, sob o comando do insigne coronel
Basílio Taborda. |
|||Foi neste prédio que
o então soldado Durvalino muito provavelmente
conhecera tanto a Francisco Trindade, quanto
a Osvaldo Santiago e com eles travara
amizade, se até não foram destacados para serviram
juntos em um dos vários batalhões de voluntários que
ali se formaram. Os mesmo se poderia conjecturar a
respeito do então 1º tenente
Francisco Fabiano Alves,
oficial subalterno, senão comandante de companhia
dessas mesmas unidades. |
|||Seja como for,
Carlos Fidêncio não soube precisar que batalhão
pertencera o soldado Durvalino por ocasião da
Revolução de 32, mas o então
capitão Dilermando Cândido de Assis, das
forças legalistas que enfrentaram nossos paulistas
em
Itararé,
para onde Durvalino e cerca de oitenta outros
companheiros foram enviados na jornada de 15 de
julho,
relata na página 108 de seu livro
Vitória ou Derrota
(1936) que as unidades por São Paulo ali presentes
eram o 8º Batalhão de Caçadores Paulista (8º
BCP) e o 1º Regimento de Cavalaria Paulista. |
|||Ora, sendo
Durvalino
soldado de infantaria e tendo ele assentado praça no
8º BCP, chances plenas são de que ele tenha
partido em fração dessa unidade (provavelmente um
pelotão ou companhia) para ter o seu batismo de fogo
nas sangrentas trincheiras de Itararé nas jornadas
de 17 a 18 de julho. |
|||Nos
combates desses dois dias,
sagraram-se vitoriosas as forças legalistas, quer pela
superioridade numérica de efetivos, quer pelo
expressivo poder de fogo de artilharia, "mais
de 12 bocas de fogo de 75mm atirando ao mesmo tempo" (ASSIS, 1936, P. 122) os quais colocaram em retirada os
defensores de Itararé, mas ficando aprisionados 45
destes. Durvalino, porém, fora um dos que
conseguira recuar, mas não antes de enterrar alguns
dos companheiros tombados na véspera. |
||||| |
||||| |
.: O soldado blindado :. |
|
|
|| |
|||Caída
a posição de Itararé, a primeira resistência do
Setor Sul, seguiam as forças getulistas em direção à
Itapetininga, mas estas não haveriam de lograr o seu
intento sem antes enfrentar a garra do soldado
paulista.
|
|||A
segunda posição de resistência passou agora a ser em
Ibiti, na qual reagrupadas foram as tropas
revolucionárias, mas novo revés sofreram em face do
grande número de armas automáticas, farta munição,
além do crescente efetivo de infantaria, cavalaria,
artilharia e aviação. |
|||De
Ibiti nossos paulistas recuaram para a
estação ferroviária de Engenheiro Maia, dali para
Itapeva e tomada esta, para o município de
Buri, onde, nos
dizeres de Carlos Fidêncio, eles "fincaram o
pé" (p. 373) conseguindo então resistir ao avanço
inimigo por algum tempo. |
|||Foi
a partir dessa resistência heróica em Buri que
Durvalino ganhou o apelido de Cabo Blindado. |
|||Com
efeito, a palavra Blindado do apelido de
Durvalino se refere ao temível
Trem Blindado
ou, como também era conhecido, o FANTASMA DA MORTE.
|
||| |
|
O
Trem Blindado |
Fonte: Portal
DarozHistoriaMilitar |
||| |
||| |
|||Tratava-se
de uma criação do Exército Revolucionário que tinha
por objetivo alvejar as forças legalistas nas
estações ferroviárias e/ou qualquer ponto da extensa
malha ferroviária onde elas estivessem. Foram
criadas seis versões do Trem Blindado. As versões de
nº 1 e nº 2 (TB 1 e TB 2) serviram no Exército
Constitucionalista do Setor Sul.
|
|||Segundo
o portal do Historiador Militar
Carlos Dároz, o
trem havia sido fabricado em Sorocaba e possuía "uma
composição formada por dois carros, um de cada lado
da máquina e revestidos de aço (duas placas de aço
entremeadas de pranchões de cerne de peroba
duríssima). Camuflado (era pintado com listas de
diversas cores), o trem era equipado com canhão de
75 milímetros e metralhadoras pesadas nos flancos, e
carregava dois potentes holofotes na parte superior". |
|
|
||| |
|
Trem Blindado de nº1 que atuou no Setor Sul onde Durvalino
combateu |
Fonte.
Trem Blindado
(2019) |
||| |
|||Tal
máquina mortífera, a distância, aparentava ser um
trem com qualquer outro, mas quando se aproximavam
desta os soldados legalistas para fazer tomá-lo, eis
que as metralhadoras surgiam das várias aberturas
existentes em seus flancos e à larga abatiam quem
quer que cruzasse o seu caminho, cenas lúgubres
melhor descritas por
Fernando Penteado Medici, testemunha ocular
desses fatos, no seu livro
Trem Blindado,
publicado em 1933: |
||| |
"Dois
quilômetros e o inimigo à vista. Os homens
avançavam, certos de que era um trem de mercadoria,
ou de víveres (realmente, como estava disfarçado),
e, em posição de atirar, ajoelhavam pelos trilhos.
As nossas metralhadoras picotaram os
inconscientes. A primeira impressão foi dolorosa.
Pungente mesmo. Presenciar umas cenas destas"
(grifos nossos). |
||| |
|||Tal
ferocidade e audácia, guardadas as devidas
proporções, também foram as características de maior
relevo observadas no soldado Durvalino pelos
seus superiores.
|
|||Com
efeito, o seu sangue frio e expressiva combatividade
perante o inimigo, fosse no combate à distância de
tiro de fuzil ou no cruzar do aço da arma branca,
demonstravam que Durvalino não arrefecia da
sua vigorosa disposição física para lutar e não
desanimava diante dos reveses e das baixas que seu
batalhão sofria. Forças lhe sobravam ainda para
enterrar os companheiros mortos e ajudar a evadir
aqueles que feridos foram.
|
|||Como
resultado dessa conduta excepcional no campo de
batalha, o antigo apelido dos tempos de goleiro da
vizinhança "Onça" não demorou muito para ser
merecidamente substituído pelo de "Blindado" e, sob
essa nova autonomásia, ficou o soldado Durvalino
conhecido como soldado blindado, cada vez
mais arrojado nas escaramuças que enfrentava quase
que diariamente com o inimigo. |
||||| |
||||| |
.: A Legião Negra :. |
|
|
||||||| |
|||Se tais atributos de coragem e intrepidez não passaram
desapercebidos aos que diuturnamente conviviam com
Durvalino, também não passarem eles ao
coronel Brasílio Taborda,
Comandante do Exército Constitucionalista do Setor
Sul, sediado em Itapetininga,
que determinou a transferência de
Durvalino do 8º BCP para unidade que ficou
conhecida como a tropa de elite do Exército
Revolucionário, a saber, a Legião Negra. |
|||Com efeito, organizada em três batalhões de infantaria, a
quase totalidade dos 3500 soldados que a compunham
eram homens de afro-descendência, na época ditos
"homens de cor", depois apelidados de “pérolas
negras”. |
|||Munidos dos mesmos uniformes do Exército
Constitucionalista, a Legião Negra distinguia-se das
demais tropas desse exército apenas no chapéu, que
era de abas largas. |
|||Segundo depoimentos de Durvalino prestados à
Carlos Fidêncio, somente dois oficiais de um
desses três batalhões que ele pertenceu não eram
afro-descendentes. O major comandante do batalhão e
um tenente comandante de uma das companhias
(FIDÊNCIO, 1986, p. 374) |
|||No entanto, o que realmente caracterizava tal tropa de
elite não era a cor da pele de seus integrantes, nem
o tamanho da aba dos chapéus, mas o alto nível de
combatividade dos mesmos perante os maiores perigos
que arrostavam bravamente por São Paulo. |
|||Segundo o portal
Piracaia.com,
em artigo intitulado "Revolução de 32 - a parte
negra de nosso história" jornais da época
enalteciam a conduta da Legião Negra nos
seguintes termos: |
||| |
“Resistindo ao
furor das hostes ditatoriais, muitas vezes
enfrentando contingentes numericamente superiores,
os bravos pretos não recuam nem se rendem. Tem sido
assim o seu proceder em diversos reencontros, fatos
que têm sido testemunhados com visível admiração
pelos demais companheiros que combatem ao seu lado”. |
|
||| |
|||Felizmente muito do que foi registrado sobre a saga da
Legião Negra não ficou restrito a jornais e
depoimentos. De fato, duas obras, recentemente
publicadas, lançam luzes sobre essa tropa e a
contribuição dos paulistas afro-descendentes na
Revolução de 32. |
|||Em 8 de julho de 2009, a Imprensa Oficial lançou
"A
Revolução Constitucionalista de 1932 em quadrinhos"s
de autoria do cartunista Maurício Pestana. Já
em 20 de julho de 2011, se deu em São Paulo a noite
de autógrafos de "A
Legião Negra - A luta dos afro-brasileiros na
Revolução Constitucionalista de 1932",
(Editora Selo Negro Edições) do jornalista
Oswaldo Faustino. |
||| |
|
Obras de Osvaldo Faustino e Maurício
Pestana que relatam sobre a Legião Negra |
Fonte: Portal do
Grupo Summus e
Revista
Raça Brasil |
|
|| |
|||E foi justamente nessa unidade que tantas glórias trouxe
para São Paulo que o soldado Durvalino veio a
participar de uma ação de combate que marcaria o
restante de sua vida para sempre. |
|||Estava Durvalino e seus companheiros de Legião
estacionados em Buri quando ordens receberam para
dali se deslocarem para as proximidades de
Capão Bonito,
mais especificamente na localidade de Capela de
Santo Antonio, conhecida pela população ali
residente de "Pimirim" ou ainda, "Apiaí-Mirim". |
|||As ordens recebidas no dia 25 de agosto de 1932 foram
claras. Expulsar as tropas legalistas que naquele
arraial haviam se instalado desde o dia 23.
Informações eram de que era tropa de cavalaria era
de pequeno efetivo, parcamente armada e municiada. |
|||Segundo o então
capitão Dilermando Cândido de Assis na página
265 de seu livro
Vitória ou Derrota
(1936), essa tropa era o
1º esquadrão do 9º Regimento de Cavalaria
Independente (I/9ºRCI) que para ali fora
estacionado com destino à Capão Bonito. |
|||Depoimentos de Durvalino à Carlos Fidêncio
apontam que os efetivos do batalhão que ele servia
eram de 150 homens. Já o capitão
Dilermando de Assis na página 267 de seu
livro indica que a tropa de Durvalino chegava
ao número de 300.
|
|||Seja
qual tenha sido a definição numérica exata, fato é
que ao redor das 7 horas da manhã do dia 27, deu-se
o contato entre o batalhão de Durvalino e o
I/9ºRCI.
|
|||E a realidade do entrevero provou que os efetivos e meios
bélicos das forças legalistas não eram parcos e
muito menos diminutos. |
|||Com efeito, Carlos Fidêncio relata em seu
livro que Durvalino e seus companheiros foram
recebidos a tiros, porquanto |
|| |
"estavam os legalistas fortemente armados, inclusive com
metralhadoras de grosso calibre. A recepção aos
soldados da Legião foi violenta. Um negro tombou aos
pés de Durvalino. O oficial mandou: Enterre o homem!
- Durvalino enterrou. Antes o transportou nas costas
por 500 metros" (FIDÊNCIO, 1986, p. 374). |
|| |
|||De acordo com informações posteriormente colhidas dos
legalistas sobreviventes desse ataque, o capitão
Dilermando de Assis relata que as forças
constitucionalistas atacaram o esquadrão
"inopinadamente, com armas automáticas, envolvendo
logo a povoação, matando um oficial, vários praças e
muitos cavalos" (ASSIS, 1936, p.267). |
|||Já do lado dos paulistas, Durvalino relatou a
Carlos Fidêncio que o tiroteio não cessava. A
sede que ele estava insuportável e desejava ela
saciá-la quando solicitou ao major comandante do
batalhão que o deixasse se deslocar até local ali
perto onde ele sabia existir uns pés de laranja
lima. |
|||O major de imediato não permitiu. Seria arriscado, não
queria perder Durvalino por causa de algumas
laranjas. Mas ele insistiu e o major aquiesceu, mas
que fosse rastejando. E assim foi o soldado. |
|||Ao aproximar-se do pé, eis que Durvalino
encontrava-se numa posição tal que podia ele
contemplar a disposição das forças legalistas, suas
metralhadoras, atiradores e cavalgada, sem ser
alvejado e muito menos visto. Enquanto ele com o
corpo colado ao chão saciava a sua sede com algumas
das laranjas que encontrou ao solo, não conseguiu
Durvalino conter o sentimento de vingança que se
apossou de seu coração ao testemunhar essas mesmas
metralhadoras atirando na direção de seus
companheiros e derrubando alguns. |
|||Era chegada a hora de virar o jogo. |
|||Retornou Durvalino às suas posições e de imediato
relatou ao major o que tinha visto. Este ainda
deliberou que antes de tomarem as metralhadoras por
aquele caminho, que parlamentassem com os
legalistas, demandando que depusessem das armas e se
integrassem aos paulistas. |
|||Isto mesmo quem fez, segundo relatou Durvalino à
Carlos Fidêncio, foi o próprio major comandante,
que na tentativa de parlamentar fora também recebido
a tiros, um dos quais quase lhe decepou a orelha
esquerda (FIDÊNCIO, 1986, p.379). |
|||Possesso pelo ataque sofrido, o major dá ordens para que
sejam tomadas as metralhadoras a todo transe. |
|||Durvalino e alguns de seus companheiros rastejam
pela picada que dava acesso até os pés de laranja e
de lá avançam em uníssono na retaguarda do inimigo,
matando a tiro e a arma branca os primeiros que
encontraram, para daí tomar das metralhadoras, as
quais viraram em direção dos demais elementos do
esquadrão de cavalaria e dispararam até o último
cartucho. |
|||As lúgubres cenas de morticínio que aí se registraram
escapam do escopo historiográfico desse texto, mas
refletiram sobremaneira nas palavras de Carlos
Fidêncio quando ele afirma que Durvalino
contabilizara dezenas de soldados legalistas
abatidos (FIDÊNCIO, 1986, p.379) entre os quais,
Dilermando de Assis confirmou um oficial, várias
praças e 43 cavalos
(ASSIS, 1936, p.268)
|
|||Seja qual tenha sido o real número de baixas legalistas
colhidas pelo fio da baioneta e pelo fogo da
metralha, o soldado Durvalino e seus
companheiros assaltantes da posição, ao final do
disparo da última munição, puderam então contemplar
o silêncio da morte que há pouco havia ceifado a
vida dos últimos legalistas que resistiram até o
fim. |
|||A cena deve ter sido por demais impactante. Até mesmo para
aqueles combatentes calejados como Durvalino,
cujo simples olhar ao redor das fumegantes
metralhadoras, bastaria para divisar corpos
desfigurados de homens e cavalos em total conluio no
campo de batalha. |
|||Tomado de forte emoção, Durvalino senta-se no chão,
levanta a cabeça aos céus e em meio àquele
inferno que acabara de sobreviver, ele chora,
convulsiva e nervosamente. |
|||Muitos de seus companheiros que com ele ombro a ombro ali
se bateram também choram. O preço daquela vitória,
sem sombra de dúvida alguma, fora alto demais para
todos que ali presenciaram os horrores vividos tão
intensamente que pena alguma seria capaz de
descrever em toda a sua plenitude e extensão. |
||||| |
||||| |
.: O Cabo Blindado :. |
|
|
||| |
|||As notícias da derrota do
I/9ºRCI em Capela de Santo Antonio impulsionaram o comando
das forças legalistas a multiplicarem os seus
recursos humanos e bélicos objetivando apertar
o cerco sobre os constitucionalistas em direção à
tomada de Capão Bonito, o que desejavam a todo
transe e finalmente conseguiram, após a vitória que
obtiveram em um dos mais sangrentos entreveros de
toda a revolução, o
Combate do Rio das Almas, nas trágicas jornadas de 17 e 18 de Setembro de 1932. |
|||Alheios ao que o futuro o aguardava, o
batalhão da Legião Negra que Durvalino
pertencia se retirou da Capela de Santo Antonio e
seguiu a cumprir outras missões que os depoimentos
prestados à Carlos Fidêncio não mencionaram,
mas o reconhecimento obtido por Durvalino em
face do combate de Apiaí-Mirim não ficou
esquecido. |
|||Em menos de 24 horas após o término
desse combate foi Durvalino promovido à
graduação de cabo por bravura. |
||| |
|
Durvalino de Toledo quando promovido à cabo do
Exército Constitucionalista |
Fonte: livro
ITAPETININGA ONTEM- HOJE (p. 376) |
|| |
|||Diante de sua intrepidez, iniciativa e coragem incontestes
sob fogo inimigo, o major comandante o parabenizou
com essa merecida promoção, o que colaborou para
aumentar ainda mais o prestígio que Durvalino já
gozava entre seus pares na Legião. E a antiga
autonomásia, soldado blindado, passara dali
em diante ser atualizada pela novíssima graduação
militar, a saber, cabo blindado. |
|||Os depoimentos de Durvalino prestados à Carlos
Fidêncio sobre a Revolução de 32 chegam ao seu
fim após o cabo blindado ter participado do
Combate do Rio das Almas, durante quatorze
dias, ao fim dos quais Durvalino foi removido
para São Paulo, onde aguardou a assinatura dos
termos da rendição que ocorreu no dia 2 de outubro
de 1932. |
|||Estava a revolução acabada para o cabo blindado. Aos
vinte e cinco anos de idade, sobrevivente dos
horrores que viveu e presenciou, Durvalino de
Toledo ainda era membro da briosa Força
Pública de São Paulo e poderia continuar a sua
carreira policial militar se assim desejasse. Mas
optou por pedir baixa da corporação e retornar ao
berço de sua existência, a Itapetininga que deixara
para combater por São Paulo nos dolorosos meses da
revolução. |
|||E como veremos a seguir, o Ex-Combatente Durvalino tinha
muito mais do que pudesse imaginar lhe esperando em
Itapetininga. |
||||| |
||||| |
.: Para os amigos Filo :. |
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|
||| |
|||Anos antes de ingressar na Força Pública, é sabido que a 30
de abril de 1927, Durvalino casara-se com
moça de Itapetininga chamada Maria da Silva. |
|||Vieram, pois, os anos da Revolução de 32 e as agonias das
incertezas de que Durvalino voltaria vivo ou
não desse conflito não foram fortes o bastante para
arrefecer o amor do jovem casal. |
|||Tanto assim foi que dessa feliz união nasceram 8 filhos,
dos quais, até a publicação desse texto no portal,
agosto de 2011, vivos entre nós se encontram a
primogênita D. Maria Francisca Toledo, que
reside no Rio de Janeiro; D. Vera Leonardo,
que reside em Santos; e o caçula do casal, o Sr.
Eugenio de Carmo Toledo, residente no bairro
Santana, em Itapetininga. |
|||As informações que seguem sobre a vida de Durvalino de
Toledo no pós-revolução nos foram gentilmente
transmitidas por esse seu filho caçula, o Sr.
Eugenio, que muito nostalgicamente relembrou de
fatos sobre a vida de seu pai que como veremos a
seguir se confundiram com a própria história de
Itapetininga. |
|||E realmente assim o foi. |
|| |
|
Viaduto "Durvalino Toledo" na rua
Antenor de Oliveira Mello Júnior |
Fonte: Portal Paulistas de Itapetininga |
|| |
|||Era 12 de agosto de 2011 quando vínhamos em direção ao
bairro do Santana em busca de familiares de
Durvalino. A única informação que tínhamos
era de que logo depois do supermercado COFESA,
na rua
Antenor de Oliveira Mello Júnior, haveria um viaduto com o nome de nosso Ex-Combatente. Em
conversa com
Carlos Fidêncio, familiares do Ex-Combatente estariam
inclusive residindo naquelas imediações. |
|| |
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Detalhe do nome do viaduto em homenagem ao
ex-ferroviário |
Fonte: Portal Paulistas de Itapetininga |
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||| |
|||Ao passar sobre o viaduto, eis a primeira de várias
revelações que estavam reservadas para aquele dia. O
nome de Durvalino ali estava consignado sobre
a legenda "ex-ferroviário", portanto, no
pós-revolução certo seria que essa fora a profissão
adotada pelo Ex-Combatente. |
|||E tais suposições confirmaram-se. Após algumas informações,
encontramos a casa onde residiu Durvalino até
falecer em 1º de Janeiro de 2001 e à porta desta,
localizada exatamente na esquina da rua Santana
com a rua Antonio de Almeida Leme, um de seus
bisnetos, o jovem Alef Durvalino de Toledo
Custódio.
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||| |
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O
bisneto Alef e e o pesquisador onde o Vet.
Durvalino residiu |
Fonte: Portal Paulistas de Itapetininga |
||| |
|||Apresentamo-nos a Alef e muito interessado ele ficou
em colaborar com o nosso trabalho. De imediato,
Alef nos contou do tio Eugenio, único
filho de
Durvalino residente na cidade e nos mostrou o
caminho até a residência dele, na parte alta do
bairro Santana, onde na tarde daquele dia 12,
passamos agradáveis horas conversando. |
|||Muito prestativo nas informações que compartilhou, o Sr.
Eugênio nos deixou a vontade para compreender de
fato quem veio a ser o Durvalino de Toledo
após a Revolução de 32. |
|||Com efeito, Durvalino havia se desligado a pedido da
Força Pública e ingressado na
Companhia Ferroviária
Sorocabana, onde fez carreira e a se
aposentar no final da década de 50. |
|||Durante os anos que trabalhou na Sorocabana, Durvalino
não deixara também de exercer a sua primeira
profissão, a de pedreiro, vindo no bairro de Santana
a construir 28 casas. Como ferroviário, contudo, foi
graxeiro e também truqueiro, funções
que desenvolveu com bastante proficiência e
profissionalismo, não só pelos conhecimentos
técnicos que detinha, porquanto era responsável pela
manutenção mecânica dos trens, como também pela
necessárias força e disposição física para a
competente condução desses trabalhos realizados em
trens de lenha, inclusive. |
|||Paralelamente às profissões de ferroviário e pedreiro, uma
outra face de Durvalino surgiria nos anos
após a Revolução e que muitos benefícios traria
àqueles que privaram de seus cuidados e amizade. Na
realidade, essa era a face da paixão pelo futebol
que ele sempre tivera desde menino e que, a bem da
verdade, nunca dificuldade alguma que enfrentara em
toda a vida conseguira abafar. |
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Durvalino (1º a esquerda de pé) e um dos
vários times |
que
organizou e foi técnico em Itapetininga (1956) |
Fonte: acervo da família Toledo |
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|||Eugenio, seu filho primogênito, tornou-se
seguramente um apaixonado pelo futebol graças a
influência de seu pai Durvalino, fundador e
técnico de times de futebol na cidade. |
|||Durante os anos 40, Durvalino tinha sido também
goleiro da Associação Atlética de Itapetininga
e nos anos que se seguiram quando se afastou como
jogador, dedicou-se ele a criar times de futebol. |
|||De fato, o time do bairro Santana foi por ele criado e
tamanha era a dedicação que tinha pelo
desenvolvimento do esporte naquele bairro que
Durvalino não só criava o time, mas fornecia
uniforme, alojamento e até alimentação aos
jogadores. |
|||De sua participação no esporte de Itapetininga, ele ainda
promovia a cada treze de maio, partidas de futebol
entre times de jogares afro-descendentes com
jogadores não afro-descendentes. Até uma foto
autografada pelo Rei do Futebol,
Pelé,
Durvalino recebeu das mãos deste, quando se
conheceram anos atrás. |
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Durvalino (5º da esquerda para a direita de pé)
e time (2008) |
Seu
filho Eugenio nele está (3º abaixado da esq. para a
direita) |
Fonte: acervo da família Toledo |
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|||Mas as paixões de Durvalino não residiam só no
futebol. |
|||Era ele de fato um homem do povo e para o povo. Tudo que
fazia era em prol das pessoas de Itapetininga, em
especial a sua juventude, e até o fim da vida, em
2001, não poupou esforços para ajudar no que pudesse
os seus semelhantes. |
|||De fato, fora Durvalino comissário de menores,
inspetor de quarteirão, presidente da Frente Negra
de Itapetininga, presidente do Clube 13 de Maio, um
dos fundadores da Escola de Samba Aristocrática do
bairro de Santana, e ainda um dos fundadores e
presidente da Associação de Amigos desse mesmo
bairro. |
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Baile no Clube 13 de Maio nos anos 70 quando da
presidência de Durvalino |
Fonte: acervo da família Toledo |
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|||Por esses e outros feitos, Durvalino não deixou de
ser merecedor do reconhecimento de seus concidadãos,
sendo agraciado com a Medalha do Mérito,
conferida pela
Câmara Municipal de
Itapetininga, em resposta ao
decreto nº 159 de 5 de abril de 1988. |
|||Da sua participação na Revolução de 32, Durvalino
recebeu a
Medalha do Cinquentenário da
Revolução Constitucionalista de 32 e seu respectivo diploma,
honrarias que ao lado de outras tantas recebidas em vida, seu filho Eugenio hoje
guarda com muito carinho. |
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Honrarias recebidas por Durvalino |
Fonte: acervo da família Toledo |
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|||Eis
uma personalidade cujo esboço histórico tivemos o
privilégio de retratar. |
|||A
de homem de Itapetininga simples, humano, bondoso,
forte, generoso e sábio pela escola da vida, pelas
intempéries da existência, pelo valor e bravura
demonstrados e pelos horrores vividos dos campos de
batalha. Tão sábio aos olhos de seus amigos e
admiradores que conhecido era por um quarto e último
apelido, filo, que advinha de filosofia. Com
isso completamos a lista de autonomásias que
Durvalino colecionou ao longo dos 94 anos que
viveu: onça, soldado blindado, cabo
blindado e
filo. |
||EDescanse em paz companheiro! Nós que aqui estamos, por vossa
memória velamos. |
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.: Agradecimentos :. |
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|||Com
a conclusão dessa pesquisa sobre o Ex-Combatente
Durvalino de Toledo, olhamos para trás e nítido
fica o quanto precisamos da colaboração de
alguém para que até mesmo uma idéia possa a vir
nascer em nossa imaginação. |
|||De
fato, como vimos, a simples
sugestão de um nome foi capaz de disparar todo um
conjunto de ações, pessoas, recursos e situações
cuja concatenação de achados e esforços deslancharam
no presente resgate histórico da vida formidável de
um Ex-Combatente itapetiningano da Revolução de 1932. |
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Ex-Combatente Durvalino de Toledo |
Fonte: acervo da família Toledo |
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|||As
aprendizagens, as amizades e os contatos realizados
no processo desse resgate, bem como toda a riqueza
da vida do Ex-Combatente que emergiu, foram os louros
mais proveitosos dessa empreitada investigativa, na
qual tudo colaborou para que as partes dessa
pesquisa fossem, a seu devido tempo, se encaixando à
medida que novos fatos, evidências e informações
foram surgindo ao longo da caminhada. |
|||A
todos aqueles que conosco aqui estiveram e cujos
nomes foram consignados nesse texto, os nossos mais
efusivos e calorosos agradecimentos. Histórias de
vida como as de Durvalino de Toledo
demonstram claramente que nossos heróis estão muito
mais próximos do que imaginamos e suas vidas
precisam ser conhecidas pelos exemplos que
caracterizam. |
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Portal Paulistas de Itapetininga |
Sustentae o fogo que a Victória é nossa! |
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